sexta-feira, 18 de julho de 2008

Como é lindo esse movimento.. =)



Na Bahia, como em qualquer lugar do mundo, sempre aparecem nomes artísticos que incrementam a sua cena cultural. Muita coisa se repete e se movimenta dentro da lógica que comanda o mercado: vender rápido e ser descartável. Nas últimas décadas, nossa música girou (e ainda gira) na rodinha da chamada "axé music", que alavancou a indústria cultural baiana, produzindo emblemas que desembocaram em uma estrela pop com dimensões internacionais, ou melhor, estadunidenses: Ivete Sangalo. Mas para a glória do Senhor do Bonfim, além da nossa musicalidade carnavalesca, outros conceitos nos chegam e nos fazem respirar pela força da criatividade e da beleza.

Navegando mares de inspiração, altivez como intérprete, letras autorais e poéticas, melodia e harmonia tocantes, um jovem baiano, Tiganá Santana, 25 anos, surge com toques musicais proponentes de uma nova leitura da musicalidade feita na Bahia, vestido de referências africanas, íntimo do mundo dos inquices (como são chamados os orixás na cultura de origem banto), mesclando atabaque e flauta, sax e agogô, violão e berimbau; cantando em quicongo, ioruba, francês, inglês, árabe e, claro, português, o artista pode parecer um eclético cultor de neo-africanidades, uma mera cria do tropicalismo, uma repetição estética para ações afirmativas da política militante dos negros no Brasil, mesmo um pouco nisso tudo, ele vai além da agilidade conceitual que as mídias precisam para apresentar os "novos" e fazer com que os mesmos sejam inteligíveis aos seus olhos e aos dos grande público.

Na voz, Tiganá Santana, traz o veludo típico dos humanos negros, tematizando a sua espiritualidade, resgatando o deísmo de seus ancestrais, relendo a presença do feminino no mundo, melodiando palavras que compõem a vasta erudição de alguém que foi preparado por sua família, para enfrentar a carreira de diplomata, e inspirado pela musa música, resolveu desaguar sua arte.

Uma arte dedicada, sem delongas nem vergonha, à divindade. O artista se apresenta como veículo de uma musicalidade advinda dos "céus" e que se retro-alimenta da perspectiva de juntar humanos, aliviar o barulho nos ouvidos, balançar os corpos, reacender a esperança para isso que chamamos de coexistência. Sua música emana silêncio e aprende com outros mestres brasileiros e universais, tais como: Dorival Caymmi, Tom Jobim, João Gilberto, Cole Porter, Ali Farka Touré, Habib Koité, Egberto Gismonti e Pixinguinha.

Em suas últimas apresentações, em lugares aconchegantes na Cidade da Bahia, como o museu Palacete das Artes, o Teatro Gamboa Nova, a Praça Quincas Berro D'água, no histórico Pelourinho, Tiganá tem sido acompanhado pelos músicos Maurício Ribeiro (flauta e violão), Alexandra Pessoa e Antenor Cardoso (percussão), e já dividiu o palco várias vezes com a mais entusiasta do seu talento, Virgínia Rodrigues, que abriu seu último show em Nova Iorque e São Paulo cantando a canção Maçalê, uma espécie de oriki (poema sagrado iorubano) dedicado a Ogum, feito por Tiganá Santana em homenagem a um multi-artista baiano chamado Gilson Nascimento, e que deverá compor um dos próximos trabalhos da diva baiana, e diz assim:

Maçalê

És Maçalê...
com a bravura que há de ter um Maçalê...
quando firmas, no chão, mais que pés de negro.
Segues na quilha da dor,
mas não hás de fenecer...
nem um sonho a menos;
velarás por um canto que hás de ser...
Maçalê... és Maçalê...
porque fazes do olhar um olhar por merecer;
uma guerra de flor... uma flor de guerreiro...
Serás mão do teu senhor,
és teu próprio massapê...
Vês?! És Maçalê,
e não farás envelhecer, Maçalê,
o que o teu nome diz:
Ogunhê!

Segundo seu autor, Maçalê significa, em ioruba, você é um com seu orixá, promovendo a idéia de unidade entre o individuo e a "entidade" que ele traz no ori (cabeça) e garante seu eixo espiritual no dia a dia.

Um trabalho vinculado à sinceridade de quem se dedica a pesquisar música, compor, cantar, inscrito em projetos conceituais que se apresentem à Bahia e ao Brasil, como possibilidade de uma estética que traduz parte do povo baiano e, ao mesmo tempo, segue dialogando com produções musicais outras, espraiadas pelo planeta, que tocam e inspiram a criação do artista aqui em questão.

Santana nasceu em uma família negra de artistas e intelectuais, formou-se em filosofia pela Universidade Federal da Bahia, fala com fluência vários idiomas, além de se dedicar, como sacerdote visceral , ao culto do candomblé de "nação angola", de matriz cultural banto, exemplificando-se como um grande conhecedor desta expressão religiosa afro-brasileira, que por conta do nagocentrismo (valorização excessiva da tradição ioruba), na Bahia, é , por vezes, desvalorizada.

O lado autoral de Tiganá Santana como compositor, ratifica suas pesquisas sobre o legado cultural dos países da África Central, principalmente Angola, Guiné-Bissau, Moçambique e redimensiona a marca sociolingüística deixada pelos congo-angolas na história do povo brasileiro.

Uma cria da ancestralidade afro-brasileira que faz música com integridade universal. Quebra rótulos, dificultando as facilidades que a recepção musical, neste estado e país, aprendeu a desenvolver por demandas mercadológicas. Um nome que se apronta para chegar, e que em seus ares de permanência, ilumina-se-nos no sabor que só a real criação pode oferecer.

terça-feira, 1 de julho de 2008

Lindo!!!


Quando, à noite, o Infinito se levanta
À luz do luar, pelos caminhos quedos
Minha táctil intensidade é tanta
Que eu sinto a alma do Cosmos nos meus dedos!

Quebro a custódia dos sentidos tredos
E a minha mão, dona, por fim, de quanta
Grandeza o Orbe estrangula em seus segredos,
Todas as coisas íntimas suplanta! 

Penetro, agarro, ausculto, apreendo, invado,
Nos paroxismos da hiperestesia,
O infinitésimo e o Indeterminado... 

Transponho ousadamente o átomo rude
E, transmudado em rutilância fria,
Encho o espaço com a minha plenitude!

Ao Luar de Augusto dos Anjos.