quinta-feira, 21 de agosto de 2008


Encontro Regional de Batuqueiros:
Dias 02 a 04 de maio de 2008 - Camboriú. Realizado pelo Grupo Jaé.
Grupo Capivara, Jaé, Maracaeté, Estrela do Sul e Arrasta Ilha
Fotos de Cláudia Eggert

Um pouco da história do "Tambô":

Dizer que o tambor é uma dança genuinamente maranhense é um equívoco, uma vez que a utilização dos tambores africanos já derruba tal afirmação, bem como os próprios criadores que trouxeram toda a mística da África. Um outro fator que nos leva a ir de encontro a essa afirmação é que o Tambor de Crioula tem inúmeras variações no restante do país. Mas o nome e o formato, isto sim, é peculiar; é maranhense.
Não há uma história certa, dentre as inúmeras que existem, do surgimento doTambor de Crioula. Para alguns integrantes de grupos, era uma festa realizada para comemoração da libertação (alforria) de um escravo, além de servir como protesto descontraído diante da condição de opressão na qual viviam os negros. Há quem diga que o Tambor surgiu logo nas fugas dos escravos, que ao se refugiarem nos quilombos, criaram a dança para animar as noites de liberdade restrita. Eram os chamados macumbeiros.
Uma outra afirmação é de que o Tambor de Crioula era também uma forma de treinar golpes diante de um confronto. Estes indícios são mais fortes, tendo em vista que no interior do Maranhão, ainda hoje, observa-se que os homens dançam, embora a maneira seja infinitamente diferente, já que “os coreiros usam bastões nas mãos ou amarrados junto ao
corpo para se defenderem de quem os deseja derrubar” (Ferretti, op. cit, p. 50).
Felipe Martins, do Tambor União de São Benedito, do Bairro da Vila Conceição, em São Luís, chega a afirmar que o Tambor era uma brincadeira nos céus:
O Tambor era uma verdadeira festa entre o secretário de Jesus – São Benedito, com as crianças. Ele saía para brincar com os meninos e de repente quando Jesus chegava encontrava ele todo pretinho, todo tisnado.
Ele ficava com vergonha e saía de fininho junto com os meninos (São Luís,
2003).
Outros coreiros afirmam até que o santo também batia tambor, o que é facilmente corrigido ao analisar-se a enorme diferença entre a época de vida terrena de São Benedito e o surgimento, em terras maranhenses, da dança. O que se pode afirmar é que o Tambor de Crioula é a mais difundida das tradições afro-brasileiras surgidas no tempo da escravidão.
Apesar de, no cenário nacional, exibir-se intensamente o samba e o afoxé, ambos não trazem toda a simbologia que carrega o Tambor de Crioula. O histórico do surgimento e o contexto e desenvolvimento dessas manifestações diferem do momento da gênese do Tambor de Crioula.
De todo o conjunto de histórias, o certo é que desde os primórdios o santo protetor é São Benedito, que para os negros seguidores das religiões africanas é o santo venerado pela
entidade Averequéte. A reverência a São Benedito se fortalece a partir do surgimento das irmandades religiosas, oportunidade em que os negros tinham de professar uma fé e estarem próximos, através de um vistoso sincretismo, das suas divindades.
Uma das principais irmandades era a de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, no Centro de São Luis, onde até hoje acontece o festejo dedicado ao Santo.
Um outro fator que fortaleceu a prática do Tambor foi a “vida social” desenvolvida pelos negros em tempos de escravidão. Embora restrita esta era muito praticada, especialmente durante a noite, já no dia somente lhes restava servir aos senhores e enfrentar a opressão a que eram forçados. Mas nas senzalas aconteciam confraternizações e o ritmo era a
batucada africana, o batuque (denominação mais comum no Brasil), a capoeira e tudo de origem afro-brasileira. Os feriados católicos também propiciavam certa folga aos escravos, o que era aproveitado com o comércio informal e com a prática da religiosidade disfarçada.
Portanto, a dança consolidou-se em São Luís e passou a ser também atrativo de mercado. Embora até meados do século vinte os sons dos tambores fossem limitados ou mesmo reservados a espaço restrito na cidade, hoje é comum, em pleno Centro Histórico, apreciar um grupo de Tambor de Crioula soltando toadas e incitando curiosidades. A polícia que outrora inibia a dança, hoje protege os coreiros na hora do espetáculo, que sob contratos, não passa de quarenta minutos em média.

Tratamos agora de descrever alguns aspectos do tambor de Crioula, a fim de ajudar melhor no entendimento da dança. Vejamos:

Os instrumentos originais do Tambor de Crioula não eram como a maioria dos utilizados nos dias de hoje. Apesar de o uso do couro ainda estar preservado, os tambores antigamente eram feitos de madeira de lei, partida em três partes, sendo cada uma do tamanho do tambor a que originaria. O som era mais grave que os instrumentos de PVC muito
utilizados hoje. Para Souza:
A mudança da matéria-prima utilizada para a fabricação dos tambores interfere na quintessência da manifestação, já que o trabalho original é totalmente artesanal e cada peça é única, enquanto os tambores de plástico
são reproduzidos em série, sem o cuidado com o processo de fabricação
(2005, p. 59).
O ritmo é impulsionado pelos seguintes instrumentos:
Tambor Grande ou Rocador, que é o maior dos instrumentos e considerado o mais peculiar. O coreiro que o toca é louvado pela habilidade; é Mestre. É ele que marca o momento da pungada; Tambor Médio, Meião ou Socador, instrumento intermediário que fica entre o Tambor Grande e o Tambor Pequeno, responsável por iniciar a dança; Tambor Pequeno ou Crivador, o menor dos tambores e que dá o pique da dança; e Matracas, que são tocadas atrás da parelha, no corpo do Tambor Grande, diferente do Bumba-Boi, quando são tocadas umas contra as outras, na mão do brincante. Embora a maioria dos grupos as utilize, muitos mestres coreiros não gostam das matracas na dança.

Os personagens do Tambor de Crioula são todos chamados de coreiros, embora esta denominação seja mais utilizada à mulher dançarina do tambor. Além do termo são usados para o chefe da cantoria mestre, dançarinas para as mulheres e tocador ou tambozeiro para os ritmistas.

Referência principalmente de São Luís, os homens geralmente usam camisetas de algodão com nomes de empresas patrocinadoras ou mesmo camisas de botão no estilo xadrez ou estampada. As mulheres usam blusas de algodão rendadas e saias de tecidos estampados.
A presença de cores e o tamanho são marcas. Há alguns grupos que usam seda para confeccionar as vestes e até aqueles, os mais novos, que utilizam diferentes estilos de desenhos para as mesmas.

Embora a dança não seja um ritual eminentemente religioso, é uma forma de pagamento de promessa. No ritual do Tambor, que quase não é realizado pelos grupos devido ao pouco tempo para as apresentações, a coreira entra com a imagem do santo antes da roda formada para que sejam prestadas as devidas reverências ao padroeiro protetor. Dona Teresinha Jansen afirma que “este ritual começou na Fé em Deus e depois de um tempo, ascoreiras dos outros grupos imediatamente passaram a fazer o mesmo. Hoje todo mundo faz”

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